Still life, a (des)construção das ruínas
Em Still life, de Jia Zhang-ke, tal como em Juventude em Marcha, de Pedro Costa, somos confrontados com uma realidade em ruínas, que se constrói e desconstrói constantemente. Mais do que a construção da barragem das Três Gargantas, que serve como pano de fundo às personagens, em Still life é todo um Mundo de emoções que também ficará em estilhaços e destroços.
É um mundo povoado por resistentes cujos corpos inistem em gravar a sua presença no seu espaço. Perante as pressões ditadas por um outro Mundo, em progresso constante, as personagens principais de Still life surgem-nos como seres passivos, estóicos e persistentes. São personagens que se negam a abandonar a realidade que conhecem. Ficaram reféns de um qualquer evento e, consequentemente, resistem de forma passiva perante a voracidade da globalização e do progresso.
Still life é poesia em estado puro. Construída sobre indiferença e a resistência ao progresso, algures entre a ténue linha do saudosismo do tempo que já não é e do tempo que virá (e de novo vem-nos à cabeça Ventura e a sua Juventude em Marcha). É um filme elegante e, provavelmente, o melhor em exibição. Tal como é um objecto peculiar, onde há lugar para tudo e onde tudo é construído a partir da observação atenta do quotidiano (o que nos traz reminiscências de Ozu). Neste labirinto de destroços e de personagens que erram pelas ruas à procura de algo que teima em fugir-lhes, fica, como força motriz, o humanismo e romantismo que guiam os protagonistas.
Still life, tal como a realidade que documenta para a posteridade, é, também, um objecto destinado a desaparecer: na velocidade vertiginosa do Mundo moderno parece não haver (muito) espaço para poetas românticos como Zhang-Ke. O que é pena.
6 Comments:
Já o vi há mais de uma semana, e as suas imagens ainda me assombram. Pura poesia visual! Uma poesia triste sobre o fim... sem quaisquer possibilidades de redenção à vista. Como é possível sentirmos tamanha tristeza ao observar um "não-lugar"?
Cumprimentos Hugo ;)
Há espaço há, Hugo! Haverá sempre espaço para os poetas, nem que seja no coração de uma minoria afortunada...
(é curioso mencionares o Juventude em Marcha, por várias vezes me lembrei dele também enquanto via Still Life - esse forçado desenraizar das pessoas e do espaço a que pertencem, essa "condenação" do tempo...)
Olá Hugo. Peço desculpa por estar a invadir a sua caixa de comentários, mas precisava de lhe enviar um email e não encontro aqui nenhum endereço electrónico...
Carlos: é muito bom. E as semelhanças com "juventude em marcha" não são meramente temáticas. Também são estéticas (as portas...) Não achas, Helena?
Sara: já comuniquei por email :-)
sim, sim, é verdade... também alguns silêncios...
Ola Hugo :-)
J'ai vu ce film, je l'ai trouvé très beau. Avec des plans magnifiques...
Comme celui où un couple se trouve dans un immeuble prêt à être démoli, tout en haut, et que le mur est "troué", on voit l'extérieur, les autres immeubles, dont un qui s'effondre...
La Chine et le chaos urbain, la démolition, la reconstruction...
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