segunda-feira, fevereiro 27

Als das Kind Kind war...

Bruno Ganz em Der Himmel über Berlin

Porque, lá bem no fundo, não deixamos de ser crianças, em vestes de adultos,
Porque, lá bem no fundo, não deixamos de querer viver,
Porque, lá bem no fundo, queremos aquilos que não temos,
Porque, lá bem no fundo, temos saudades do que deixámos de ter:

"(...) Als das Kind Kind war,
wußte es nicht, daß es Kind war,
alles war ihm beseelt,
und alle Seelen waren eins (...)

Als das Kind Kind war,
war es die Zeit der folgenden Fragen:
Warum bin ich ich und warum nicht du?
Warum bin ich hier und warum nicht dort?
Wann begann die Zeit und wo endet der Raum?
Ist das Leben unter der Sonne nicht bloß ein Traum?
Ist was ich sehe und höre und rieche
nicht bloß der Schein einer Welt vor der Welt?
Gibt es tatsächlich das Böse und Leute,
die wirklich die Bösen sind?
Wie kann es sein, daß ich, der ich bin,
bevor ich wurde, nicht war,
und daß einmal ich, der ich bin,
nicht mehr der ich bin, sein werde?(...)"


[excerto da "Canção da Infância" ("Lied Vom Kindsein") de Peter Handke)

[tradução (livre) para português]
"(...)A criança, enquanto criança
não sabia que era uma criança
e [para ela] tudo não tinha alma
e todas as almas eram uma só (...)

Quando a criança era uma criança,
era o tempo para estas perguntas:
Porque é que eu sou eu e porque não sou tu?
Porque estou aqui e não ali?
Quando começou o tempo e onde acaba o espaço?
A vida debaixo do Sol não será apenas um sonho?
O que eu vejo, ouço e cheiro
não será a ilusão de um Mundo antes do Mundo?
Uma vez que existe o Mal e as pessoas,
será que o Mal existe realmente?
Como é possível que eu, que sou eu,
Não exista antes de ser,
e que, algum dia, eu, que sou eu,
deixe de ser quem sou?(...)"

Der Himmel über Berlin [Asas do Desejo], de Wim Wenders, um filme belíssimo e imprescindível.

3 Comments:

Blogger Hugo said...

Grande Tejo!

A única parecença que há entre mim e o Mundo do Direito prende-se, "apenas", com a formação académica...como diria um conterrâneo meu (Miguel Torga, no belíssimo Tantum Ergo): "Eu, pecador, aqui diante de mim me confesso"

Quanto ao "Der Himmel über Berlin", temos o casamento perfeito da imagem com a poesia, maxime a "Lied" do Handke, que, a cada momento, é declamada por Damiel (genial Bruno Ganz). Um filme, acima de tudo e passe o pleonasmo, visual onde a imagem impera, mas os diálogos, apesar de parcos, são profundos...

Para chegarmos à conclusão: "Jetz ich weiss was kein Engel weiss" (agora sei o que nenhum anjo sabe). Sim, porque não há existência espiritual ou etérea. Há que viver, sentir, ter alegrias, derrotas, vitórias, amar...enfim, sentir tudo aquilo que faz de nós humanos.

Um Damiel que vive narrando as pequenas coisas que vê ao amigo Cassiel, mas um Damiel sózinho, que adora sentar-se no topo de uma estátua a contemplar o Mundo, qual eremita, até à altura em que vê Marion e a passa a contemplar a ela...

E tudo isto tendo como pano de fundo um céu cinzento omnipresente e opressivo, que paira sobre uma Berlim dividida por um muro, o mesmo muro onde Damiel se tornará humano e ao qual dirá em acto contínuo: "schön!" (belo!). Ironia ou não, eis a questão...

Retrato da condição humana, rectius, daquilo que ela devia ser ou metáfora de uma Alemanha já desaparecida (felizmente!), nunca me consegui decidir muito bem por qual delas, mas é certo que "Der Himmel *uber Berlim" é daqueles filmes que foram feitos para ver e rever, nem que mais não seja para recordar o belo "als das Kind Kind war"...

10:32 da manhã  
Blogger Hugo said...

Já que estamos numa de culpa mea, "sozinho" e não "sózinho". Isto de escrever à pressa e não parar para olhar...

Mil perdões!

12:11 da manhã  
Blogger Ricardo said...

Wenders nunca foi o meu "cup of tea", mas este filme gosto bastante.

11:22 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home