terça-feira, fevereiro 21

À procura da América perdida

Dennis Hopper, Peter Fonda e Jack Nicholson em Easy Rider

Viagem à procura de uma América perdida e tentativa de (re)descoberta do sonho Americano, Easy Rider, de Dennis Hopper, é um marco do cinema independente e, acima de tudo, é um marco no cinema politicamente empenhado.

Tendo como pano de fundo a viagem de dois motociclistas (Wyatt e Billy), Hopper dá-nos um retrato cru e, de certa forma, datado dos EUA. Basta lembrar que estamos no ano do lendário festival de Woodstock e estamos em pleno mandato de John Kennedy. Mau grado este pormenor, o filme não deixa de manter viva sua força, mormente porque mais não é do que o retrato da procura de liberdade (ou, talvez, da ilusão da liberdade). Rectius, porque Easy Rider quebra com convenções sociais através dessa viagem espiritual em busca da liberdade.

Provocatório, Hopper não deixa de evocar nomes lendários da História dos EUA através dos nomes das personagens principais: Wyatt (Earp) e Billy (the Kid). Trata-se de uma forma de desconstrução do mito da americanidade que é vísivel pelo facto de Wyatt, se designar "Capitão América". Um capitão américa com um estilo de vida pouco saudável e recomendável (atente-se que os nosso protagonistas financiam a viagem através da venda de drogas), um pouco à imagem da ideia de degradação dos EUA que Hopper não deixaria de ter.

Uma viagem que não deixa passar por alguns dos ícones dos EUA, como seja Monument Valley, que funcionam como contraponto com um estilo de vida decadente da juventude. Lembre-se a hilariante estadia no acampamento hippie ou o rocambolesco encontro com as prostitutas. De tudo isto é feito Easy Rider, filme desmitificador, que usando de forte ironia oferece um cortejo de símbolos americanos (desde a bandeira, passando por Monument Valley ou pelos chapéus de Cowboy), que figuram lado a lado com marginais e drogados, que mais não são do que os filhos de uma América que já não existe e que Wyatt e Billy se propuseram encontrar.

Uma América conservadora (que ainda hoje é), que reage mal ante pessoas estranhas (à imagem de People are strange dos Doors), designadamente quando essas pessoas têm cabelos compridos, barba por fazer e um aspecto pouco limpo. Uma América que, na essência, pode ser reconduzida a qualquer outra nação. E é entre a frágil tensão do conservadorismo/puritanismo de uma América intolerante e o idealismo de uma geração jovem (corporizada em Wyatt e Billy) que flui este road movie contra-cultura.

Uma geração que encontrou na marijuana e na música Rock uma válvula de escape para poder responder ante a pressão (social e não só) que sobre ela impende. Acima de tudo, há que nunca esquecer:

"Like a true nature's child

We were born, born to be wild"

Ou, dito de outro modo, há que nos deixar levar pelo sonho (pois, conforme dizia António Gedeão, O sonho comanda a vida), mesmo que esse sonho venha a redundar num rotundo fracasso, como no caso de Wyatt e Billy.

3 Comments:

Blogger Daniel Pereira said...

Filme importantíssimo para afirmar a "nova Hollywood". Desconstrução do "western", do homem de fronteira, enfim, do sonho americano. Ainda assim, um filme que, tecnicamente, envelheceu/irá envelhecer mal.

5:23 da tarde  
Blogger Juom said...

Não concordo. Penso que se vê hoje bastante bem, apesar de provavelmente não ser tão revolucionário como teria sido na época, mas parece-me ainda bastante bom. E tem uma banda sonora genial...

12:13 da manhã  
Blogger Hugo said...

O carácter revolucionário de "Easy Rider" reside, sobretudo, na desconstrução da Americanidade e no facto de por a nu os ideais de toda uma geração.

A par de outros fois filmes, "The graduate" de Mike Nichols(adaptado do romance homónimo de Charles Webb) e, sobretudo, Midnight Cowboy de John Schlesinger, "Easy Rider" funcionou como antecâmara dos Mavericks que haveriam de chegar e dar cartas na década de 1970, criando a nova Hollywood e marcando, praticamente em definitivo, o fim do studio system.

Quanto a mim, sou dos "românticos" que ainda hoje fica seduzido por aquela liberdade em que o Wyatt e o Billy vivem...

12:41 da manhã  

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