terça-feira, julho 25

O poeta da alienação

Michelangelo Antonioni

Ver um filme de Michelangelo Antonioni equivale a ver projecção da vida tal como a conhecemos. Talvez por isso fiquemos assoberbados pela solidão avassaladora e dilacerante que se abate sobre nós. Cada plano, cada sequência, trabalhados até à perfeição, de forma aturada, são o sinónimo de deserto. Da alma, do ego, de nós, do Mundo.
Um Mundo povoado por edifícios imponentes e impessoais. Tão impessoais como os seus habitantes e as relações que entabulam entre eles. Antonioni, mais do que um arauto da desgraça ou do que um profeta nihilista, limita-se a ser o cronista do Mundo que o rodeia. Um Mundo tão dele como nosso. E talvez seja essa familiaridade, essa facilidade em reconhecermos realidades que nos são caras, que nos leva, instintivamente, a repudiar o seu Cinema. Um Cinema imponente, visual e poético. Mas, acima de tudo, um Cinema real. Tão real como um documentário. Em Antonioni não vemos ficção. Na sua essência, e uma vez despojada de artificiosismos, vemos a Verdade. Nua. Crua. Visceral.
É cero que o que parece ser por vezes não é. A realidade é a mais estranha de todas as fantasias. Mas em Antonioni, tendo como ponto de partida um qualquer enredo, temos todo o tratado filosófico do Homem pós-moderno: só, deprimido, à beira do abismo e à procura de escapes. O cinema de Antonioni, é, pois, o Cinema da alienação. De todos aqueles incapazes de se integrarar no Mundo que lhes é dado a conhecer. Mais importante, é o Cinema sobre a dimensão trágica da consciência dessa alienação.
Bem vistas as coisas, este é o nosso Mundo. Comumemte apontam o seu cinema como chato. Ora, também o Mundo tal como o conhecemos o é. É esse um dos seus muitos méritos: a sua câmara nunca falha nesta documentação da realidade.
Antonioni é Verdade, tal como a Verdade é Cinema.