sexta-feira, fevereiro 2

Passo em frente

Ao descrever de forma quási-documental o périplo do jovem Edmund por uma Berlim em destroços, Rossellini voltou a dar um salto em frente. Mais do que a necessidade de captar a realidade envolvente, em Germania, anno zero o que acaba por impressionar mais é a descrição da degradação moral de um Mundo onde todos vivem miseravelmente e sobrevivem à custa de esquemas sombrios.
Edmund, o jovem adolescente que arca com a responsabilidade de sustentar a sua família, será mais uma dessas vítimas. Levará a cabo uma tarefa que julga ser heróica: matar o pai, de molde a que este não cause mais transtornos à família. Seguir-se-á o desprezo e a incompreensão. E é nessa altura que vemos um périplo angustiado pela Berlim em destroços, tal como a alma de Edmund. Mais do que neo-realista, Germania, Anno Zero acaba também por ser um estudo psicológico sobre a alienidade, já que este é o Mundo que negligenciou, esqueceu e rejeitou Edmund. O seu suicídio, mais do que uma fuga em frente, é a consciencialização dessa recusa e a fuga de um Mundo cruel. Talvez Edmund seja o símbolo da morte do nazismo (aquele que o viu crescer e educar), mas é também o retrato da incompreensão a que foi votado. Deste modo, Germania, Anno Zero seria o primeiro de uma série de filmes pessimistas da autoria de Rossellini.

8 Comments:

Blogger Ursdens said...

O que mais me impressiona em Alemanha Ano Zero é toda a carga dramática que envolve aquele suicídio... O suicídio de um garoto, tal como um homem o faria...

6:14 da tarde  
Blogger Nuno Pires said...

Puissant et bouleversant...

Mais um belo texto. Rossellini inspira-te!

7:14 da tarde  
Blogger david santos said...

Olá!
Ugo, o tetxo está espctacular! A imagem assenta que nem uma luva.
Parabéns.

8:20 da tarde  
Blogger Hugo said...

Ursdens: é um momento impressionante (no mínimo).

Nuno: sim, gosto muito de Rossellini.

David Santos: muito obrigado.

5:45 da tarde  
Blogger André Dias said...

sei bem que as imagens fixas ou em movimento dos filmes não nos pertencem de todo, e que é em si provavelmente um abuso utilizá-las para nossa conveniência. talvez não se repare, mas esforço-me por justificar essa conveniência de cada vez. assim, gosto de pensar que há, apesar de tudo, um gesto próprio no acto de escolher uma imagem fixa ou um excerto de um filme, e que tal pode ser tomado em consideração por outros, nomeadamente quando tendo uma actividade que se pode ver como próxima. por isso, gostava de reclamar a minha participação (certamente ínfima, se comparada com a de rossellini) na existência online desta imagem de «germania anno zero», pois escolhi-a cuidadosamente a partir de uma cópia vhs, tendo inclusive que o pejo de apagar o logo da rtp. foi publicada aqui, sem texto. creio que seria extremamente difícil escrever um texto que a merecesse... em todo o caso, espero que compreendas que não me parece útil esta promiscuidade tão vizinha, pelo menos no que diz respeito às imagens e aos excertos do youtube (como o de «la maman et la putain»), de que faço uso (quase) exclusivo daqueles extraídos por minha mão. não me entendas mal, aprecio o esforço que fazes na composição do teu blogue. abraço, andré

4:48 da tarde  
Blogger Hugo said...

Caro André Dias,

obviamente que não levo a mal. No que toca à imagem do Germania Anno Zero, ela foi retirada daqui (sítio italiano):

www.claudiocolombo.net/Dvd/germaniaannozero.htm

sendo que aqui: (http://www.claudiocolombo.net/Dvd/copyrightimmagini.htm) refere-se que foi o próprio a retirá-las do DVD.

Em qualquer caso fica o registo da inconveniência dessa promiscuidade.

Cumprimentos,
HRA

5:03 da tarde  
Blogger André Dias said...

caro hugo, tens toda a razão no que se refere à tua imagem do «germania anno zero». desculpa ter-me precipitado na impressão. não deixa de ser curioso tratar-se exactamente do mesmo fotograma (que, tanto quanto me pude aperceber, não estava sequer online há algum tempo). mas, se observares as duas imagens com cuidado, perceberás, no entanto, que guardam a marca da sua origem diferente. a feita pelo italiano (e que tu utilizaste) tem a deformação dos pixels e ainda a margem deixada pela captura, enquanto a que eu fiz tem o desalinhamento das linhas provocadas pelo vhs. é uma estranha maneira de se fazer prova de boa fé, mas enfim.

1:28 da manhã  
Blogger Hugo said...

André Dias: não há qualquer problema. Foi uma mera coincidência. E parabéns pelo "Ainda não começámos a pensar". Aprende-se muita coisa por lá.

Abraço,
HRA

1:35 da manhã  

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