quinta-feira, agosto 23

Cinema sobre Cinema (!?)

i) Eis o mui inovador (mini) ciclo sugerido à Cinemateca.
ii) O Daniel, com razão, afirma que não estamos perante algo original.
iii) O Francisco, com igual razão, ressalva que se Mulholand Drive e In a lonely place estão incluídos na categoria, qualquer filme é um filme sobre cinema.
Por via de regra, um filme sobre filmes acaba por ter imanente uma reflexão profunda sobre o Cinema e as suas relações com os espectadores e com as obras feitas por outros. É isso que vemos, por exemplo, em Le mépris, de Godard (em bom rigor, em qualquer filme feito por um cinéfilo isso acontece. À cabeça, vejam-se os companheiros de armas da Nouvelle vague). Até o celebérrimo Nuovo Cinema Paradiso faz isso.
Mais: um filme sobre filmes é, sem sombra de dúvida Onde jaz o teu sorriso, de Pedro Costa. Basta ter presente que é um filme que, partindo da montagem de Sicilia!, aborda uma concepção de Cinema e um modo (peculiaríssimo) de fazer filmes. Lembro-me igualmente do filme que "baptiza" o blogue que propôs o ciclo, mas, também, uma outra visão do Cinema e do seu mundo peculiar: Kaagaz ke phool, de Guru Dutt.
Ademais, o filme sobre filmes pode ser uma coisa pós-moderna. Pode, pura e simplesmente, ser construído sobre um conjunto de obras prévias que servem de catalisador para criar, rectius recriar um género. E, assim, poderíamos ter Once upon a time in the west de Leone ou um qualquer policial estilizado de Jean-Pierre Melville: Le Cercle Rouge, que, como Le Samouraï, até tem um diálogo salutar com o Cinema oriental.
Esta não é uma questão de má vontade: pura e simplesmente, a escolha dos filmes do (mini) ciclo (metade deles!) é má (leia-se forçada) e desligada* do tema que lhe está na base. Erros à parte, é um (mini) ciclo tão inovador, como o eram as constantes projecções de Hitchcock na mesma esplanada.
Já agora, e à guisa de sugestão, por que não dar a voz quem percebe mesmo disto? Dar carta branca a realizadores da praça para organizar pequenos ciclos. Algo que, recentemente, foi protagonizado por Jorge Silva Melo.
Sugestão II (e só porque se fala, também, da Cinemateca Portuguesa): e uma retrospectiva dedicada à "docu-ficção" portuguesa? De Belarmino, de Fernando Lopes à obra de António Reis, passando pelo actual Pedro Costa e pelo Acto de Criação, de Oliveira, vai um conjunto de filmes que carecem de ser divulgados conjuntamente e não de forma espúria.
Sugestão III - Pensando bem, um ciclo dedicado ao Cinema Novo Brasileiro também seria algo interessante. Estranhamente, por cá, contrariamente à ficção para dona-de-casa desocupada criada além-Atlântico, não parece ser muito conhecido.
* obviamente, não se descarta a possibilidade de eu estar absolutamente errado...

16 Comments:

Blogger Ursdens said...

Este comentário foi removido pelo autor.

2:48 da tarde  
Blogger Ursdens said...

É, de facto, pobre o ciclo... Acrescentasse-se "Peeping Tom" e a coisa até poderia ser minimamente coerente...

Cumprimentos cinéfilos!

2:49 da tarde  
Blogger Luciano said...

Eu penso de compreender a tua reflexão. Em síntese o filme sobre filmes possui o sentido vero é intimo do Cinema que sai do filme por suscitar na mente dos expectadores outras imagens, outras situações ("À cabeça, vejam-se os companheiros de armas da Nouvelle vague").

3:06 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Se MULHOLLAND DRIVE não é uma das supinas e singulares manifestações de filme sobre filmes, enforco-me com película em praça pública. Serão tantos os que habitam tão ferroadamente no passado que lhe passam completamente à ilharga obras-mestras contemporâneas? É impressão minha ou uma bela fracção de indivíduos masculinos que procuram desesperadamente evidenciar um vínculo à paixão pelo cinema manifesta diversos sintomas de SPM? Um copinho de leite morninho e cama não será o suficiente para acalmar vossas constantes urticárias. Ou será que tudo uma forte dor na ligação do úmero ao cúbito e ao rádio? De uma desesperado saltitar para dizer: "Presente! Eu conheço a Nouvelle Vague... hmm... o expressionismo alemão... hmm... o neo-realismo italiano... hmm... eu conheço Fassbinder e tal..."...

6:01 da tarde  
Blogger Hugo said...

Gustavo: não existisse o artigo 135.º do Código Penal e eu respondia à letra à primeira linha do comentário.

Não há problemas de dor de cotovelo ou afins (note, por favor, que agradeço penhoradamente a lição de anatomia que, no caso, era desnecessária).

Acontece que Mulholand Drive não entra no tema nem por nada (e, note, por aqui não se contestou - longe disso - a valia da obra). Acontece que, pelo menos para mim, o facto de o enredo contar com profissionais do meio cinematográfico não chega...respondo-lhe com uma pergunta: consideraria "White dog" um filme sobre filmes? Afinal, até se tecem comentários sobre o meio por lá. E "Prima della rivoluzione"? Idem.
Quer um filme sobre filmes recente? "Il caimano".

O facto de o filme de Lynch usar constantemente o binómio "real/irreal" - algo que é apanágio do Cinema - justificará a inclusão? Sinceramente, penso que não. E "In a lonely place", filme que muito gosto, é sobre filmes? Porquê? Porque o Bogey faz de argumentista? Claro que não. Obviament, são opiniões.

De qualquer modo seria bem melhor terem-se lembrado de Dziga Vertov, por exemplo.

Grato pela visita,

6:19 da tarde  
Blogger Hugo said...

Adenda: a propósito disto do meta-cinema, lembrei-me de outro filme que vi recentemente: "Irma Vep", do Olivier Assayas.

Também teria sido uma escolha interessante e bem mais acertada...

6:32 da tarde  
Blogger noite americana said...

Tenho estado a acompanhar a estimulante discussão e prometo não voltar a interromper mas gostaria apenas de fornecer a seguinte informação: foi a própria Cinemateca que indicou o In a Lonely Place, para subtituir um dos filmes que tinhamos sugerido e que não estava disponível. Carry on. DM

6:34 da tarde  
Blogger Hugo said...

Ilustre DM,

todas as interrupções são sempre recebidas de bom grado.

6:36 da tarde  
Blogger Nuno said...

Esquecer "Le Mépris" deveria ser punido por lei.

"Où gît votre sourire enfoui?" e "Irma Vep" sao duas outras obras pos-modernas indispensaveis. Excelentes sugestoes, Hugo.

Acrescentaria ainda "Der Stand der Dinge" de Wenders.

8:25 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Se calhar a "noite Americana" também poderia estar incluido...

9:27 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Desculpem lá mas é como as cerejas...The Bad and the Beautiful , Beware of a Holy Whore (em alemão parece-me imprenunciavel), Stardust Memories do Allen (é o meu favorito dele), Sunset Boulevard, Close-Up do Kiarostami, David Holzman's Diary, Last Action Hero, Living in Oblivion, Lisbon Story, Vertov, Barton Fink, The Player do Altman,A Star Is Born do Cukor, Boogie Nights, Sullivan's Travels..ufa!

9:41 da tarde  
Blogger Hugo said...

"Cuidado com a santa puta!" (Warnung vor einer heiligen Nutte) não é assim tão impronunciável. É uma questão de hábito. :-)Quanto ao resto..que dizer? Uzi, o meu leitor (mais) atento e,provavelmente, o mais exigente no seu melhor.

Um grande bem haja!

10:14 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Danke Herr Hugo

10:22 da tarde  
Blogger Portalegrense said...

Olá Hugo.

Andei um pouco afastado mas verifico que o seu blog continua a ser de grande qualidade.(dos melhores da Blogosfera do Cinema)

Abraço e até breve.

11:43 da manhã  
Blogger fcorado said...

naõ posso estar mais de acordo com toda esta discussão. a selecção é disparatada mas ainda mais disparatada conseguem ser as opiniões do sr. gustavo. mas de facto, há opiniões para tudo. Filmes sobre filmes ou o cinema no cinema é um tema tratado variadas vezesm, havendo mesmo um festival dedicado exclusivamente a esse tema e não acredito que o filme do Lynch se enquadre na temática. todas as outras sugestões me parecem muito mais acertadas sobretdo "A Noite Americana", né?

12:15 da tarde  
Blogger António Miguel Miranda said...

Divulgação

Mais um Blog que se tornou um Livro!

Filme da apresentação disponível no YouTube em “Camarada Choco”

www.camaradachoco.blogspot.com
www.camaradachoco.blogs.sapo.pt

5:34 da tarde  

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