sábado, janeiro 12

Ideias sublimes


"Pensei que num momento destes teria ideias sublimes"
Construir um filme em elipse absoluta não é novidade. Quando, no caso, falamos de Bresson muito menos. Acontece que em Le diable probablement, mais do que uma elipse, ficamos com uma sensação de vazio infindável e somos acossados por um sem número de questões. Fiquemos por uma: Charles, estudante angustiado, incapaz de adaptar a sua natureza espiritual a um mundo agressivo e dominado pelo choque, acaba numa depressão profunda. Instando um companheiro toxicodepente, morre. Acontece que tal como o título sugere - probablement, ou seja, o campo da incerteza absoluta - nunca chegamos a perceber a sua motivação. Ouvimos um "Nunca hás-de saber no que estou a pensar", seguido de um tiro e Charles jaz inerte no chão de um cemitério.
Será este um filme sobre a natureza do Mal? Afinal, a dada altura pudemos ouvir:
Qui est-ce donc qui s'amuse à tourner l'humanité en dérision ? Oui, qui est-ce qui nous manœuvre en douce ?
Le diable probablement.
Nunca o saberemos. Não obstante, a crítica aos horrores da sociedade industrial é omnipresente, incutindo a ideia de Charles ser um mártir que se imola por, pura e simplesmente, não conseguir aguentar as pressões externas. Nas palavras do próprio, não é um doente. Limita-se a ver o Mundo com clareza. Ironicamente, é um psicanalista a oferecer-lhe a solução final.