Zorba, the Greek
À partida parece fácil resumir "Zorba, o Grego": a história de um tímido escritor inglês (Basil) que herda uma velha mina em Creta e que acaba por contratar como ajudante um homem que conhece no porto (Zorba), enquanto espera pelo embarque. Pelo meio, já em Creta, apaixona-se por uma jovem viúva, que desperta os desejos de todos os homens cretenses. Como tudo se passa na Grécia, há que ter o devido fim trágico, e a viúva é assassinada no largo de uma Igreja em virtude de um dos seus pretendentes se ter suicidado. Caso típico de vindicta privada, portanto. O que é muito curioso é o facto de ser uma cena em tudo semelhante À da peça "O crime da Aldeia Velha" de Bernardo Santareno. Saliento a emoção com que é filmado o momento em que a viúva é acossada. Através de uma câmara móvel, de modo a exprimir o desespero e a reacção animalesca da viúva, qual raposa refugiada na sua toca receando os caçadores...

Alan Bates e Irene Papas em Zorba, o Grego
Se tivermos em consideração que o livro é a adaptação do romance Alexis Zorbas de Nikos Kazantzakis, poderemos ser tentados a afirmar que estamos perante uma obra menor, pois, como é consabido, reina a velha máxima de que o livro nunca é superado pelo cinema.
Se pusermos de lado, este último pormenor, abstraindo-o momentaneamente, verificamos que Michael Caccoyannis faz uso de alguns dos ensinamentos dos neo-realistas. Um exemplo: boa parte dos actores é amadora. Mais não é do que a população da ilha de Creta, o que, confere, indelevelmente, maior realismo e credibilidade à história (um exemplo clássico deste recurso é o fantástico "la terra trembla" de Luchino Visconti).
A composição estética do filme é sempre muito simples, o que ajuda em muito a concentrarmo-nos nos longos e profundos diálogos travados entre o histriónico Zorba (magnífico Anthony Quinn) e o tímido Basil (eficientíssimo Alan Bates). E é precisamente aí que reina a grande força do filme: Caccoyannis retira as principais lições do romance, permitindo-se fazer desfilar as misérias e esplendores da existência humana: a profunda necessidade de aproveitar ao máximo tudo o que Vida oferece, desde a mais simples das amizades, passando por uma refeição ou a luta pelo Amor de uma Mulher. Dito de outro modo, temos o horaciano carpe diem em todo o seu esplendor.
Em Zorba, temos tudo isto, aparecendo Basil como o verdadeiro case study (uma cobaia de Zorba?) e Zorba como o agente provocador, uma projecção do Super Homem de Nietzsche: vital, histriónico, confidente e, humano, o que leva a que proceda à anàlise das coisas de um ponto de vista emocional, mas pragmático. Mas nunca através de um prisma puramente racional.

Há filmes de muito maior valia técnica, bem sei, mas Zorba tem o condão de tocar fundo na minha Alma. Faz-me reflectir, viajar às profundezas do meu "EU", tentando descobrir-me e melhorar-me e isso, creio, é o mérito de um bom filme. No meu caso, o filme da minha vida.
Recordarei hoje e sempre a cena final em que, finalmente, Basil deixa de recalcar as emoções e após a derrocada de uma construção feita por Zorba, pede para ter aulas de dança. E é aí, em plena aula, ante a interrogação "Hey boss, did you ever see a more splendiferous crash? ", liberta o seu verdadeiro eu, rindo, como nunca fizera em todo o filme e, provavelmente, em toda a vida.
A banda sonora de Mikis Theodorakis é inesquecível, tal como é esta aula de dança, verdadeiro hino à Amizade verdadeira e desinteressada entre os Homens.

Anthony Quinn e Alan Bates, um hino à amizade
Acima de tudo, afigura-se essencial não menosprezar a adaptação de Caccoyannis, pois a adaptação de um livro de forte cariz filosófico não é tarefa fácil e, neste caso, foi feito de forma muito eficiente e, acima de tudo, sem grandes pretensiosimos de se criar "cinema-arte". Na verdade, creio que o filme foi feito na lógica do póquer: pagar para ver. Uma aposta muito bem conseguida e que consegue sobreviver muito bem ao passar dos anos, tal como um bom Vinho do Porto.
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